Fernanda Lira mergulha na essência de Amy Winehouse em seu novo projeto, 'Remembering Amy'

12:33 PM

Foto: Marcos Hermes

Vocalista e baixista da banda Crypta explora um novo lado artístico ao interpretar Amy Winehouse em um tributo que une música, emoção e reflexão sobre os desafios da fama

Texto: Ingrid Natalie (instagram: @femalerocksquad)

Conhecida por seu vocal agressivo e marcante à frente da banda Crypta, Fernanda Lira agora explora um lado diferente de sua musicalidade com 'Remembering Amy', um tributo a Amy Winehouse que vai além da performance musical. O projeto não só revive os sucessos da icônica cantora britânica, mas também propõe uma reflexão sobre sua trajetória, desafios da fama e saúde mental.

Nesta entrevista, Fernanda compartilha o que a motivou a embarcar nessa nova fase, como o estudo da obra de Amy influenciou sua técnica vocal e composição, e de que forma esse projeto pode impactar sua carreira no futuro.

FRS: O que te inspirou a criar o 'Remembering Amy'? Foi algo que você já queria fazer há tempos ou surgiu recentemente?

Fernanda Lira: Sempre tive vontade de explorar um canto mais limpo e melodioso, diferente do que faço na minha banda principal, Cripta, onde uso um vocal mais distorcido e agressivo. Sempre imaginei ter um projeto solo nessa linha, mas via isso como um plano a longo prazo. Como gerencio minha banda, nunca consegui dedicar tempo suficiente para desenvolver essa ideia.

No entanto, no ano passado, essa necessidade ficou muito forte, junto com a vontade de expandir meu universo de expressão e habilidades. Com um novo plano de carreira em mente, percebi que era o momento certo para finalmente tirar esse desejo do papel.

Ainda assim, como eu não tinha tempo para criar um projeto solo do zero, encontrei uma solução natural: sempre postei vídeos nas redes sociais cantando com minha voz limpa e recebi muitos comentários positivos dos fãs. Especialmente quando interpretava músicas da Amy Winehouse, minha voz parecia se encaixar muito bem, e muita gente pedia para eu fazer algo mais nesse estilo ou até gravar covers dela.

Foi então que, no ano passado, depois de postar mais um vídeo cantando Amy, me deu um estalo: por que não? Como já tinha planos de expandir minha carreira para outras frentes, percebi que esse era o caminho ideal. Eu sabia que os fãs gostavam, que fazia sentido dentro do meu desenvolvimento artístico e, acima de tudo, que era algo que eu realmente queria fazer. Como já conhecia e sentia as músicas da Amy de cor e salteado, seguir por esse caminho foi um processo natural para mim.

FRS: Amy Winehouse teve alguma influência na sua trajetória musical, mesmo vinda de um gênero diferente do metal?

Fernanda Lira: Com certeza! Como artista multifacetada, acabo absorvendo tudo ao meu redor e, depois de um filtro, trazendo essas influências para minhas vivências na Cripta.

Com a Amy, aprendi muito sobre diferentes técnicas vocais, respiração e impostação de voz, o que também acabou me ajudando tecnicamente nos meus vocais na Cripta. Mas acho que a maior lição que ela me deu foi sobre composição: escrever com profundidade, transformar vivências e sentimentos em música de uma forma autêntica e acessível.

Ela me mostrou como criar uma ponte de conexão com as pessoas, mesmo quando escrevemos sobre experiências pessoais. Usei muito isso na Cripta, onde abordo questões psicológicas e momentos intensos que vivi. Amy foi uma das artistas que me ensinou a poetizar emoções, tornando-as bonitas de ouvir e fáceis de se identificar. Então, a maior influência dela em mim foi nessa parte lírica.

Foto: Marcos Hermes

FRS: Você precisou adaptar sua técnica vocal para interpretar as músicas dela?

Fernanda Lira: Com certeza! Cantar na Crypta é tecnicamente um outro mundo. Eu já cantava em casa, mas nunca tive a oportunidade de fazer aulas de canto enquanto aprendia. Por isso, sentia que cantava sem uma técnica muito apurada, com alguns vícios comuns de quem é autodidata. Isso fazia com que algumas coisas fossem mais difíceis para mim, então precisei me adaptar bastante.

Para isso, comecei a fazer aulas de canto com o Heleno, que é backing vocal da minha banda. Fiz dois meses de aulas com ele, onde ele me passou noções gerais de canto e me ajudou a me distanciar um pouco da técnica que eu usava na Crypta. Ele identificou minhas dificuldades ao interpretar Amy e me ajudou a cantar de forma mais fluida, encontrando um equilíbrio entre fazer um tributo à Amy e ainda trazer um pouco da minha identidade vocal.

Essas aulas revolucionaram minha maneira de cantar, especialmente no repertório da Amy. Foi um processo essencial, e a cada ensaio eu via uma evolução muito grande. Sem essas aulas, teria sido muito mais difícil alcançar um resultado bonito e confortável para esse show. Então, com certeza, foi um passo fundamental para mim.

Veja Fernanda Lira cantando 'Rehab'



FRS: Ao interpretar as músicas da Amy, alguma delas te tocou de uma forma diferente agora que você está mais imersa na obra dela?

Fernanda Lira: Com certeza, eu já conhecia e gostava de todas as músicas da Amy, mas principalmente com esse projeto, onde eu canto e conto sobre a trajetória dela, como se fosse uma biografia cantada e comentada. Muitas das músicas me impactaram ainda mais. Antes, eu me identificava com elas, vinha de um lugar de identificação com suas letras. Hoje, fazendo esse projeto, onde conto sobre a biografia dela, eu vejo as músicas com uma outra perspectiva, como se fosse uma visão de dentro. 

Claro que nunca vou entender o que a Amy sentia quando escreveu suas músicas, mas depois de muito estudo — lendo livros escritos pelo pai dela, pelo melhor amigo, além de anotações e rascunhos dela — eu passei a ouvir suas músicas de uma forma muito mais íntima. Parece que, ao ouvir, as letras ganham um novo sentido; lembro do que li, estudei, e percebo o quanto certas músicas têm um peso maior do que imaginávamos. Algumas, como "Wake Up Alone" e "Love Is a Losing Game", por exemplo, ela sempre disse que eram difíceis de cantar ao vivo. 

Agora, depois de entender toda a trajetória dela, consigo entender por que ela evitava ou não queria cantá-las. Músicas que falam explicitamente sobre seus traumas, como "What Is It About Men", fazem ainda mais sentido dentro dessa nova perspectiva.

FRS: O projeto também traz reflexões sobre saúde mental e os desafios da fama. Como você vê a importância de falar sobre esses temas no cenário musical?

Fernanda Lira: Eu acho isso muito importante, especialmente nos dias de hoje. Se as pessoas tivessem falado mais sobre saúde mental e os desafios da fama quando a Amy estava viva, talvez muitas das coisas que ela passou poderiam ter sido evitadas. A resistência que ela tinha em entender e cuidar da sua saúde mental, além dos abusos que sofria, tanto pela imprensa quanto pelas pessoas na rua, poderiam ter sido diferentes se houvesse mais compreensão na época. Mas, por outro lado, hoje temos a exposição da internet. Como será que ela lidaria com isso? Como isso a afetaria?

Quero trazer uma reflexão sobre isso, não como algo que poderia ter sido diferente, mas para promover o debate. Vejo a importância de falar sobre o tema, pois todos nós, artistas ou não, temos nossa saúde mental a zelar, e todos enfrentamos desafios, sejam eles visíveis ou não. Eu gostaria de discutir isso, assim como falo sobre o tema nas minhas redes sociais, para desmistificar a ideia de que os artistas são apenas máquinas de criar arte e entretenimento. Na verdade, todo artista é um ser humano, como qualquer outra pessoa, com desafios e realidades distintas, mas com fragilidades e vulnerabilidades também.

Quero trazer isso à tona nesse projeto, para que possamos discutir como as pessoas compreenderam que a Amy era uma pessoa com problemas de saúde mental e como a fama repentina afetou sua vida de maneira tão profunda. Acho que existe uma importância enorme nesse debate.

FRS: Em quais aspectos esse projeto pode influenciar sua música no futuro, seja na Crypta ou em um trabalho solo?

Fernanda Lira: Muitíssimo, eu acho que viver tudo isso que estou vivendo agora já está sendo muito importante e um verdadeiro esquenta para o meu trabalho solo a longo prazo. Acho que estudar tecnicamente o que a Amy fazia vai contribuir muito para a criação das minhas músicas no futuro. Além disso, a experiência com uma Big Band e a compreensão desse mercado, que é completamente diferente do meu trabalho com a Crypta, também vai influenciar na criação e na execução do meu trabalho solo lá na frente. Então, tudo o que estou fazendo aqui com a Amy agora será crucial para o meu trabalho solo. Eu diria que, além de ser um grande prazer, está sendo uma enorme escola, onde estou buscando aprender o máximo possível para aplicar depois no que é pessoal.

FRS: Com o 'Remembering Amy' agora fazendo parte da sua vida artística, como você pretende equilibrar esse projeto com a agenda intensa da Crypta?

Fernanda Lira: A Crypta é minha prioridade, então os compromissos com a Crypta vêm em primeiro lugar, e nas brechas eu encaixo as coisas da Amy. Esse ano, por que eu resolvi trazer essa questão da Amy? Porque é um ano em que acredito que estamos pisando no freio, já que vamos fazer menos do que no ano passado. Embora ainda façamos muitas coisas, será menos intenso, especialmente em relação ao turismo. Vamos passar alguns meses em casa, e é nesses meses que quero trazer esse projeto da Amy à tona. Enquanto isso, seguimos compondo o disco da Crypta. Todo dia, dedico um pouco de tempo para o disco da Crypta e ensaio um pouquinho para o projeto da Amy. Assim, vou equilibrando as duas coisas. 

Claro que esse projeto da Amy é uma parte muito importante hoje na minha carreira, mas entendo que a Crypta tem uma importância um pouco maior, então acabo priorizando a Crypta com o maior prazer do mundo. Mas é isso: enquanto eu tiver folga com a Crypta, estarei fazendo o projeto da Amy, e quando estivermos fazendo a Cripta, estarei aprendendo com a Crypta. A rotina ficou um pouco mais puxada, mas está tudo perfeitamente equilibrado.

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